No dia 9 de novembro, a advogada Luiza Emrich Torreão Braz, sócia do Escritório Torreão Braz Advogados, acompanhou, em São Paulo, a I Conferência Nacional de Arbitragem, cuja realização foi promovida pelo Conselho Federal da Ordem com a OAB São Paulo. Dentre os principais temas, destacam-se os tratados no primeiro painel “Aplicação dos Precedentes Vinculantes na Arbitragem” e o segundo “Arbitragem e Administração Pública”.
Logo na abertura do primeiro painel, o Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Ruy Rosado de Aguiar Junior, tratou da importância da aplicação de precedentes jurídicos nos processos arbitrais. O Ministro destacou a possibilidade de reclamação quando precedentes, originados de julgamentos em assunção de competência ou em recursos repetitivos, não são observados.
Ao fazer um paralelo com a Ordem Pública, ponderou que os precedentes não ensejam, por si só, qualquer obediência pelos juízes arbitrais, pois assim como o árbitro pode “julgar contra a lei e não há possibilidade de anular a sentença por ser contra a lei, o precedente que se insere nessa ordem jurídica no mesmo nível, tirante aqueles dois do STF, podem ser afastados pelos árbitros” e essa inobservância não implica em anulação da sentença arbitral”, salvo quando “houver uma ofensa à ordem pública e quando o precedente expressar essa ordem pública”.
Em seguida, o dr. Carlos Alberto Carmona, advogado e professor da USP, comentou acerca das normas brasileiras e das proibições legislativas de aplicação do sistema de precedentes na arbitragem. Para o professor “Dizer que eles não devem ser levados em consideração em um julgamento é exagero. Isso abrange códigos, normas, resoluções, regulamentos, doutrinas e jurisprudência. Isso pode levar a decisões erradas, e sabemos que decisões erradas não são passíveis de correção em tempo hábil”, o que explica o grande número de impugnações de sentenças arbitrais.
Para fechar o painel, palestrou o dr. Joaquim Tavares de Paiva Muniz, membro da Comissão Especial de Arbitragem do Conselho Federal da OAB. Em sua exposição, ele observou as significativas mudanças que o novo Código de Processo Civil (CPC) abarcou e a relevância de tais mudanças no contexto do julgamento pela arbitragem.
Segundo Muniz, a arbitragem não deve ser vista como resposta para acabar com os 108 milhões de processos que aguardam resolução pelo Poder Judiciário. Para ele, “A arbitragem não tem função intrínseca de resolver essa massa, ela vai resolver os grandes casos, mas resolvendo o grande caso ela dá um grande ajuda para a Justiça. O grande caso geralmente é extremamente complexo do ponto de vista processual. Você tira isso da Justiça. Retirar isso do judiciário e dar nas mãos de quem tem tempo, disponibilidade e conhecimento, que são os árbitros é um grande ponto para Justiça. E o segundo ponto é celeridade. Isso é importante para o investidor, em que tempo é dinheiro. Isso é importante para atrair investimento ao país”.
O segundo painel, inaugurado pelo dr. Arnoldo Wald, presidente de honra da Comissão Especial de Arbitragem do Conselho Federal da OAB, tratou da aplicação e da importância da arbitragem nas demandas em que a Administração Pública figura.
Wald destacou que esse método de resolução de conflitos “evoluiu em paralelo com o estado de direito, ou seja, com a limitação do poder estatal a fim de garantir direitos e estabelecer a responsabilização do poder público por seus atos. No entanto, ainda não é, nas grandes lides envolvendo o poder público, um processo tão rápido e eficiente como desejaríamos”.
Lembrou que no campo internacional essa alternativa não é considerada nova, mesmo quando envolve a Administração Pública e exemplificou com o caso da Petrobras, que adota cláusulas compromissórias em seus contratos internacionais desde os anos 1950. A novidade, segundo Wald, é a presença do Poder Público como novo ator em julgamentos de arbitragem dentro do Brasil.
Na mesma linha, a advogada e professora de arbitragem, dra. Selma Lemes, falou das fases da arbitragem no Brasil e de sua evolução com a presença de um novo ator, a Administração Pública. Salientou que a “arbitragem está sofrendo mutações decorrentes do ambiente mundial e da complexidade das negociações internacionais. E isso vem acompanhado de alterações não apenas legislativas. Muitas alterações são feitas também pelos regulamentos de arbitragem, que se deparam com toda essa complexidade. Contratos relacionais, contratos complexos e a possibilidade de fazer unificação e procedimentos arbitrais”.
Em suas palavras, “o ponto nevrálgico da arbitragem com administração pública é a questão da arbitrabilidade objetiva e a grande confusão que se faz entre direito patrimonial disponível, que pode ser submetido a arbitragem, e o interesse público indisponível. São conceitos que não se misturam, não têm absolutamente nada a ver e isso quem falou foram os ministros Eros Grau e o Luiz Fux”.
Por fim, o dr. Gustavo Justino de Oliveira, advogado e professor da USP salientou que “a mera presença da administração pública em um ou nos dois polos do processo arbitral obrigatoriamente faz com que todo o sistema arbitral olhe para aquele conflito, pelo fato de envolver o interesse público”. Para o professor, há uma nova agenda para a arbitragem no Brasil, que decorre do regime jurídico ao qual os contratos se subordinam.
Assim, tanto o árbitro quanto as câmaras de arbitragem precisarão ter muita cautela no trato de questões que envolvam o poder público e, por isso, “a sociedade deve se manter vigilante”.
Em resumo, o evento demonstrou a importância dos métodos extrajudiciais de resolução de conflitos. Tais métodos que promovem a solução e a prevenção de litígios, e valem-se dos princípios da informalidade, economia processual, celeridade e flexibilidade não só ajudam a reduzir a excessiva judicialização no País, mas também a imensidão de processos que aguardam resolução do Poder Judiciário.
Essa nova realidade, que tende a ser cada vez mais aplicada no âmbito da Administração Pública, merece muito estudo, reflexão e, principalmente, debate, pois apesar da promessa de ser uma alternativa para a burocracia e morosidade do Poder Judiciário, pode implicar graves riscos à princípios fundamentais tão caros em nossa democracia.