O Mandado de Segurança Coletivo e o Alcance da Substituição Processual

- Núcleo de Direito Administrativo em Direito Administrativo

A Constituição da República, em seu art. 5º, LXX, alínea “b”, possibilita a impetração de mandado de segurança coletivo por organizações sindicais, entidades de classe ou associações legalmente constituídas e em funcionamento há pelo menos um ano, desde que em defesa dos interesses de seus membros ou associados. A Lei n. 12.016/2009, em seu art. 21, regulamenta esse dispositivo constitucional e esclarece que os mandados de segurança coletivos visam à tutela dos direitos líquidos e certos da totalidade, ou de parte, dos membros ou associados, na forma prevista estatutariamente, dispensada autorização especial para a impetração.

A dispensa de autorização especial para a impetração de mandado de segurança é elemento essencial para distinguir as ações mandamentais coletivas – submetidas ao regime de substituição processual – das ações coletivas comuns – submetidas ao regime de representação processual – e previstas no art. 5º, XXI, do texto constitucional.

As diferenças entre os regimes de substituição processual e de representação processual estão atualmente bem delineadas pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal. Os Enunciados 629[1] e 630[2] da Súmula da Suprema Corte, por exemplo, tratam dos mandados de segurança coletivos impetrados mediante substituição processual e reforçam a legitimidade das entidades independentemente da manifestação de vontade dos membros ou associados.

Por outro lado, os julgamentos dos Recursos Extraordinários 573.232/SC e 612.043/PR, ambos sob a sistemática da repercussão geral, delimitaram a lógica da representação processual. Nessas ocasiões, o Supremo Tribunal Federal esclareceu que as ações coletivas mediante representação processual dependem da aprovação expressa dos membros ou associados e que essa aprovação pode ser dada de modo individual ou assemblear. Ademais, deixou consignado que, uma vez exigida autorização expressa, somente são beneficiários das ações aqueles que eram integrantes da entidade quando do ajuizamento da demanda coletiva.

Não obstante a clareza da distinção feita pelo Supremo Tribunal Federal, o Poder Público ignora sistematicamente o alcance da substituição processual nos mandados de segurança coletivos contra ele impetrados, no intuito de impor limitações que somente são pertinentes às ações submetidas à lógica da representação processual.

Nesse contexto, multiplicam-se os casos de mandados de segurança coletivos em que o Poder Público arbitrariamente limita os efeitos das decisões àqueles que já eram vinculados às entidades impetrantes quando da propositura da ação.

Trata-se de limitação manifestamente ilegal, porquanto, como dito anteriormente, a diferenciação da atuação das entidades como substitutas ou representantes processuais já foi bem delineada pelo STF, especialmente nos julgamentos do Recurso Extraordinário n. 573.232 e do Recurso Extraordinário n. 612.043/PR.

Consoante destacado recentemente pelo Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento da Ação Cautelar 3.971/SP, não se pode submeter as ações mandamentais às regras contidas no art. 5º, XXI, da Constituição da República. Os mandados de segurança coletivos são regidos pelo inciso LXX do art. 5º e, por isso, alcançam “todos os membros ou associados que, tendo a mesma situação jurídico-material tutelada, se filiaram antes da propositura da ação, no curso do processo e após o trânsito em julgado.”

A insistência do Poder Público em desconsiderar tais distinções, com o claro intuito de se furtar ao adequado cumprimento das ordens judiciais, precisa ser combatida, portanto.

 

[1]Enunciado n. 629 da Súmula do STF: “A impetração de mandado de segurança coletivo por entidade de classe em favor dos associados independe da autorização destes.

[2]Enunciado n. 630 da Súmula do STF: “A entidade de classe tem legitimação para o mandado de segurança ainda quando a pretensão veiculada interesse apenas a uma parte da respectiva categoria.”

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