A instituição das gratificações de desempenho no âmbito do Poder Executivo Federal visou a encontrar meios de conceder vantagens aos ativos que, em tese, não seriam extensíveis aos inativos. Afirmava-se a impossibilidade de incorporação integral – aos proventos de aposentadoria e às pensões – de um benefício vinculado ao desempenho do servidor.
Todavia, durante anos o Poder Público alijou os inativos do recebimento das gratificações mesmo sem que os servidores ativos fossem avaliados. Por isso, consolidou-se ampla jurisprudência que reconheceu o caráter genérico de tais verbas e determinou a majoração do pagamento aos aposentados. A Administração, então, viu-se motivada para regulamentar as avaliações de desempenho e, assim, criar um artifício para legitimar o pagamento minorado das gratificações aos inativos.
Ocorre que, com a edição da Lei n. 13.324/2016, novamente muitas gratificações passaram a ser integralmente compatíveis com a aposentadoria, de modo que a situação dos aposentados e dos pensionistas titulares do direito à paridade remuneratória precisa ser mais uma vez revista.
Os artigos 87 e seguintes da Lei n. 13.324/2016 instituíram um novo mecanismo de incorporação das gratificações, por meio do qual a pontuação recebida na atividade agora pode ser integralmente transposta para a aposentadoria ou para a pensão. Para que essa opção seja exercida, a lei exige que os servidores façam jus à paridade e tenham recebido a vantagem durante 5 anos antes da concessão da aposentadoria ou da instituição da pensão.
Na prática, aqueles que se aposentaram ou se tornaram pensionistas cinco anos depois da criação da respectiva gratificação passam a recebê-la como se ativos fossem, porquanto a média das pontuações auferidas na atividade passa a ser incorporada aos proventos e às pensões. Para esses servidores, a Administração Pública finalmente está respeitando a garantia constitucional da isonomia entre ativos e inativos.
Ocorre que a Lei n. 13.324/2016 desconsiderou que as mudanças por ela promovidas na natureza jurídica das gratificações exige uma revisão da situação funcional de todos aqueles que fazem jus à paridade. No momento em que se tornaram integralmente compatíveis com a inatividade, as gratificações se transformaram em vantagens integralmente genéricas, o que impede sejam deixados de fora da nova sistemática de incorporação determinados aposentados.
Ao permitir a incorporação das gratificações apenas para aqueles que receberam as verbas por 5 anos na ativa, a lei criou 2 grupos de inativos que, não obstante terem regimes previdenciários e direitos constitucionais rigorosamente idênticos, recebem tratamentos jurídicos distintos. Em ambos os casos, os servidores fazem jus à paridade e à integralidade, mas apenas para aqueles que passaram para a inatividade recentemente esses direitos são respeitados. Para os aposentados e para os pensionistas mais antigos, que não cumpriram o “pedágio” de 5 anos, a Administração Pública mantém o pagamento das gratificações em montantes muitos reduzidos, geralmente em 50% do total garantidos aos servidores ativos.
Essa é uma postura absolutamente incompatível com o ordenamento jurídico. Os tribunais do país possuem sólido entendimento de que, no âmbito do Regime Próprio de Previdência Social, a garantia constitucional da paridade remuneratória impõe a extensão integral, aos proventos e às pensões, das parcelas remuneratórias genéricas.
Se agora é possível que determinados servidores levem para a aposentadoria exatamente a pontuação que por eles era percebida quando estavam em atividade, é inaceitável que outros, com os mesmos direitos, recebam as mesmas verbas em montantes muito inferiores. Trata-se de uma grave incoerência jurídica, que precisa ser reparada pelo Poder Judiciário. Afinal, como salientado anteriormente, já está suficientemente difundida no direito administrativo brasileiro a ideia de que parcelas remuneratórias genéricas, por serem compatíveis com a inatividade, devem ser estendidas integralmente aos proventos de aposentadoria e às pensões.
Por essas razões, é de se esperar que o tema volte à pauta do Poder Judiciário. E, se este for coerente com a vasta jurisprudência produzida até então, a insistência do Poder Executivo em desrespeitar os direitos dos aposentados será mais uma vez obstada.